Crianças, Aprendizagens e Esporte Educacional[1]
CRIANÇAS
No ventre
Impulsividade do SER em SER
INTERATIVIDADE?
Ao nascer
Possibilidade de SER com SERES
INTERATIVIDADE?
Ao crescer
Potencialidade para SER entre SERES
INTERATIVIDADE?
Minha área de pesquisa e ação mais direta é a educação. Contudo, não compreendo o conteúdo da educação de forma fragmentada. Por isso, estou quase sempre em imersões em áreas como comunicação, arte e esporte, entre outras, por fazerem parte do que compreendo como conteúdo de uma educação integral. Muitas das minhas experiências têm sido feitas no Formação, ong que ajudei a criar e pela qual também atuo desde 1999.
O Formação trabalha com a ideia de que todas as pessoas são capazes de aprender e, quanto mais cedo proporcionamos alimentos para esses aprendizados, mais nos nutrimos e nos desenvolvemos.
Também partimos da premissa de que, sendo a Educação Infantil a única etapa da educação que não recuperamos em idades mais avançadas, devemos durante a infância proporcionar às crianças os mais variados conhecimentos, não lhes negando a possibilidade de que flua seu desenvolvimento intelectual, afetivo e motor.
Pesquisas indicam que até os 6 anos de idade as crianças estão potencialmente ou verdadeiramente construindo bases para tudo que poderão vir a ser quando adultas. Estão moldando nessa idade o seu cérebro, órgão de adaptação do ser vivo ao seu ecossistema e ao seu momento histórico, que molda-se pela experiência vivida a cada instante desde o ventre da mãe, até quando nasce e vai crescendo. Dessa forma, práticas saudáveis de diálogos afetivos, introdução à realidade pelo universo lúdico dos contos de fada, entre outras são tão importantes como formas de ligar e conectar a criança com o seu mundo real circundante.
Também é nesse período da vida, do nascimento até os seis anos de idade, que o cérebro alcança 90% de seu crescimento e desenvolve 90% de suas potencialidades. Até essa idade, a criança aprende tudo o que se lhe queira ensinar – e também o que não se pretende que ela aprenda e o que não se imagina que ela está aprendendo.
Como aprendemos?
Como vimos, do nascer aos seis anos de idade aprendemos muitas coisas. Segundo algumas teses, isso ocorre por:
- assimilação do que vemos, ouvimos, assistimos, praticamos;
- pela experimentação de hipóteses cognitivas do assimilado;
- pela superação dos erros construtivos no processo inicial de experimentação;
- pelos conflitos cognitivos que ocorrem quando comparamos o que sabemos com o conhecimento mais elaborado do outro;
- pela continuidade da assimilação, que gera mais experimentação, provocando novos erros. Esses, por sua vez, produzem novos conflitos ocorridos quando comparamos o que sabemos com o que o outro sabe, num processo contínuo que pode nos levar à aprendizagem almejada, se houver conteúdos e ações que ajudem no nosso desenvolvimento.
Nem sempre se entendeu dessa forma!
Existem pelo menos três concepções estudadas pela psicologia a partir do momento em que pesquisadores foram em busca de respostas para suas inquietações a respeito do desenvolvimento que acontece durante a vida de um indivíduo (ser humano). Três dessas concepções surgem das respostas às indagações e pesquisas realizadas: o inatismo, o ambientalismo e o interacionismo.
A primeira teoria (inatismo) defende que o indivíduo carrega desde seu nascimento traços que irão determinar o que ele será profissionalmente e que habilidades terá futuramente, com adoção de expressões do tipo “ele nasceu para ser um jogador”.
O ambientalismo defende a ideia de que o indivíduo constrói habilidades apenas pelo ambiente em que ele é inserido na vida social, sendo o homem um ser passivo, que pode ser manipulado e controlado pela simples alteração do ambiente ou da situação em que se encontra. Não há nessa concepção a preocupação em explicar os processos pelos quais a criança raciocina e se apropria do conhecimento.
Assim, até o século 19 e início do século 20, a história da psicologia, em particular da psicologia do desenvolvimento cognitivo, transcorreu em boa medida submetida ao referencial epistêmico da filosofia da cisão, herdada do pensamento moderno. Por exemplo, propuseram explicações do desenvolvimento cognitivo das crianças “por dentro”, recorrendo à arquitetura natural do conhecimento, e “por fora”, como marca dos estímulos e dos fatores sociais. Ou se estabeleceu uma separação rígida entre uma psicologia que explica o desenvolvimento de habilidades naturais e uma psicologia compreensiva, apropriada para a inserção cultural da ação humana, retornando à dicotomia entre ciências naturais e ciências sociais.
Nas concepções interacionistas o desenvolvimento humano é fruto da interação de fatores biológicos e ambientais (quando citamos ambiente nos referimos aos espaços sociais, históricos e culturais). Nessa concepção, podemos então afirmar que somos sujeitos ativos e temos a capacidade de construir nossas características de acordo com a relação que estabelecemos com o meio físico, social e cultural. Portanto, o desenvolvimento acontece por meio das relações socioculturais. É nessa concepção que o desenvolvimento produz aprendizagem e aprendizagem produz desenvolvimento.
Dessa forma, compreende-se que durante muito tempo o sujeito que aprende foi visto como alguém que já nascia predestinado a ser um “homem de saber” ou um “ignorante”. Na área do esporte, quem o praticava era apenas visto como uma máquina muscular sem grande capacidade de pensar, de refletir e de atuar criticamente na sociedade.
A importância de Piaget
A psicologia servia quase sempre para medir a capacidade das pessoas e avaliar se estavam prontas para seguir em frente no seu processo de desenvolvimento intelectual. A partir do final do século 19 e ao longo do século 20, pensadores, como Piaget, Freud, Erikson[2], colocaram em dúvida essa forma de avaliar o processo de aprendizagem do ser humano e passaram a defender que as pessoas aprendem na interação com o meio ambiente e não já nascem com uma habilidade nata.
Na concepção anterior a Piaget, o processo de aprendizagem era compreendido como sendo um processo de acumulação de conteúdo. Para Piaget, a aprendizagem é um processo que acontece por meio de aproximações sucessivas e não de forma acumulativa e homogênea, como se supunha até esse período.
Em sua obra, Piaget afirma que o desenvolvimento cognitivo das pessoas desde a infância é sequencial e caminha de estruturas mais simples para estruturas mais complexas, sendo que o desenvolvimento da inteligência passa por estágios que são os mesmos para todos os indivíduos e se sucedem na mesma ordem (Banks – Leite, 1997).
Contribuições de Vigotsky
Outro pensador que muito contribuiu para se entender os processos de aprendizagem foi o russo Vygotsky. Para ele, a aprendizagem da língua escrita se dá não somente por meio da aquisição da linguagem falada, mas também por vários outros conhecimentos. Ele critica visões da Pedagogia e da Psicologia que consideram, por exemplo, a atividade da escrita apenas como uma habilidade motora.
Exemplificando na área do esporte, poderíamos dizer que a atividade motora, apesar de ser importante no esporte de alto rendimento não é a única habilidade na prática esportiva que precisa ser desenvolvida e/ou que, ao ser desenvolvida, possibilita uma prática emancipadora e conquistas e aprendizagens importantes, mesmo no campo pessoal. E dependendo da forma como se introduz essa prática desde as primeiras idades, o seu desenvolvimento e uso poderá ter um formato ou outro.
Por exemplo, regra geral, no futebol ensina-se a chutar bem a bola, mas não se ensina a ser feliz, livre e solidário; ensina-se a competir e não a ser solidário, mesmo sendo um jogo de equipe.
Quando pensamos o conceito BOLAção foi para trabalharmos essa outra perspectiva, desde o momento em que a criança constrói suas bases de saberes para toda a sua vida, que segue…Assim, BOLAção surge para ampliar a dimensão desenvolvida pela prática do futebol e de outros esportes. Ou seja: a bola que vai de pé em pé também produz solidariedade, alegria, favorece a construção de laços e aumenta o índice coletivo de felicidade.
Freire, o problematizador
Outro pensador que tem contribuído muito com a compreensão de como acontece o processo de aprendizagem é o brasileiro Paulo Freire. O seu pensamento também reforça a compreensão de que a aprendizagem ocorre na convivência social, uns com os outros, nos diversos meios onde interagem por meio de diálogos, com relações horizontais e problematização de conteúdo. Ele diz em sua obra mais famosa, Pedagogia do Oprimido, que as pessoas têm conhecimentos que não podem ser esquecidos no processo educativo e que o conhecimento se forma na relação que se tem no e com o mundo circundante.
Para Freire, conhece-se o desconhecido a partir do já conhecido, sendo que o já conhecido da criança, do adolescente, do jovem ou do adulto está centrado em sua própria realidade. É claro que a realidade do adulto tem mais relação com a vida real, enquanto que a realidade das crianças tem muita relação com o mundo da imaginação, o lúdico, as brincadeiras. Por isso, é tão importante haver riqueza de ações nesse sentido.
Similaridades entre formas de aprendizagens
Na atualidade, alguns teóricos continuam investigando os processos de aprendizagem dos conhecimentos e das atitudes das pessoas na situação de aprendiz ou de produtor de conhecimentos. No que se refere à alfabetização, nos anos 1990, além de Freire e de tantos outros, estudos de duas argentinas (Emília Ferreiro e Ana Teberosky), têm sido adotados no Brasil.
A analogia da aprendizagem do esporte com a alfabetização (aprendizagem da base alfabética) nos ajuda a compreender que quase tudo que aprendemos ocorre da mesma forma: assimilando, experimentando, errando, com conflitos de conhecimento, novas experimentações, até se consolidar determinadas aprendizagens.
As pesquisas realizadas por Ferreiro e Teberosky com alunos do ensino fundamental em escolas públicas e privadas na Argentina confirmaram que o processo de aprendizagem da língua escrita é semelhante ao processo de aprendizagem da fala. Aprendemos por assimilação à medida que há a convivência com as pessoas no mundo e que se tem acesso às linguagens falada e escrita. Isso ocorre também com outros aprendizados: o da música, o da pintura, o do futebol. Com a bola no pé e muitos conteúdos que possibilitam o desenvolvimento social e humano, muitos outros conhecimentos são assimilados e podem ser reaplicados.
Ao se comparar a aprendizagem da língua escrita e de outros aprendizados à aprendizagem da fala, muitas coisas tornam-se mais claras. A criança não aprende a falar, por exemplo, a palavra “água”, porque alguém lhe ensinou primeiramente a – g – u – a, mas porque ouviu as pessoas falarem normalmente água. Ela apontava para a água, a mãe perguntava: “você quer água? água?, etc… Também ao assimilar a fala da palavra água, ela não diz de uma só vez água, mas, inicialmente balbucia aaa, aga…. até chegar a compreender que o som ouvido é água. E essa compreensão ocorre porque ao seu redor falam água e não repetem como a criança aaa, aga…etc..
Do mesmo modo, desde criança aprendemos a jogar jogando. A introdução nas creches das Quadras BOLAção de FutRua3 e Esportes 3 surgiu baseada no pensamento de que por trás de toda criança, jovem e adulto não existe exatamente um atleta, mas um sujeito capaz de aprender, um sujeito cognoscente – aquele que tem a capacidade de conhecer – e que não é, portanto, meramente um par de pernas, ou de braços, mas um ser omnilateral, cheio de capacidades, com um potencial ilimitado, que ao ter acesso ao conhecimento aprende, se desenvolve e pode contribuir para o desenvolvimento de muitos outros.
É por isso que acreditamos na importância de se continuar a desenvolver e disseminar metodologias de esportes educativos voltadas para o desenvolvimento humano, social e da nossa própria sociedade. Que nas Quadras BOLAção de FutRua3 ou Esportes 3, diferente do que ocorre nas famosas Arenas de Roma e de muitas outras que se sucederam, crianças, adolescentes e jovens aprendam solidariamente a lutar por um mundo melhor.
Piaget nos ajudou a avançar na área da Psicologia e de conhecimentos relacionados às formas como ocorre a aprendizagem. Ainda hoje, as suas descobertas continuam sendo importantes. Mas não paramos por aí. Muito mais foi refletido e descoberto nessas áreas.
Novas pesquisas e experiências que se sucederam apontaram outros elementos fundamentais na compreensão do processo de aprendizagem. Continuamos avançando com outros intelectuais, sobretudo com a compreensão de que o aprendizado ocorre fundamentalmente mediante a interação social. Uma das considerações essenciais foi a de que não é apenas interagindo com objetos e com o meio ambiente que se aprende, mas principalmente na relação com pessoas, por meio da convivência social, em processos de mediação.
A mediação em Vigotsky
Vygotsky, contemporâneo de Piaget, desenvolveu a teoria sócio histórica conhecida também como teoria históricocultural ou sócio interacionista. Piaget e Vygotsky vão enfocar o processo de desenvolvimento como uma interação constitutiva entre o indivíduo e a sociedade, entre a interiorização e a atividade do indivíduo, ou entre o sujeito e o objeto do conhecimento.
O russo deteve-se ao estudo dos mecanismos psicológicos mais sofisticados, o que ele chamava de funções psicológicas superiores, típicas da espécie humana. Dizia (1994) que são essas funções que possibilitam o controle consciente do comportamento humano, a atenção e a lembrança voluntária, a memorização ativa, o pensamento abstrato, o raciocínio dedutivo e a capacidade que se tem de planejar as ações.
Durante suas pesquisas, ele procurou identificar as mudanças qualitativas do comportamento que ocorre ao longo do desenvolvimento humano e qual sua relação com o contexto social.
Segundo Vygotsky (1984), as funções psicológicas superiores não são processos inatos, mas se originam nas relações entre indivíduos humanos e se desenvolvem ao longo do processo de internalização de formas culturais de comportamento.
São diferentes dos processos psicológicos elementares, que estão presentes nos animais e nas crianças pequenas, como por exemplo: reações automáticas, ações reflexas e associações simples, que são de origem biológica.
As principais ideias que ele defendeu nessa sua teoria, contidas em obras como “A Formação Social da Mente” (1984) e “Pensamento e Linguagem” (1995), são:
- As características tipicamente humanas não estão presentes desde o nascimento do indivíduo, nem são mero resultado das pressões do meio externo; elas resultam da interação dialética do homem com seu meio sociocultural.
- Ao mesmo tempo em que o ser humano transforma o seu meio para atender suas necessidades básicas, transforma-se a si mesmo.
- As funções psicológicas especificamente humanas se originam nas relações do indivíduo e seu contexto cultural e social, ou seja, o desenvolvimento mental humano não é dado a priori, não é imutável e universal, não é passivo, nem tampouco independente do desenvolvimento histórico e das formas sociais da vida humana.
- O cérebro, produto de uma longa evolução, é o substrato material da atividade psíquica que cada membro da espécie traz consigo ao nascer. Contudo, esta base material não significa um sistema imutável e fixo.
- São os instrumentos técnicos e os sistemas de signos, construídos historicamente, que fazem a mediação dos seres humanos entre si e deles com o mundo. A linguagem é um signo mediador por excelência, pois carrega em si os conceitos generalizados e elaborados pela cultura humana.
Todo esse arcabouço nos dá respaldo para trabalhar o conteúdo do esporte desde cedo como ferramenta de desenvolvimento social, abordagem coletiva e solidária e não como forma meramente de promoção pessoal, vitória individual, mesmo quando se trata de uma equipe de 11 jogadores em campo. Meninos e meninas ou pessoas com e sem deficiências físicas jogando juntos são formas de trazer para dentro do esporte práticas de superação de desigualdades, de combate a preconceitos e a injustiças e de fortalecimento da inclusão de todos.
Vygotsky (que não é um teórico do esporte, apenas nos respaldamos no seu pensamento mais geral), ao abordar a consciência humana como produto da história social, aponta na direção da necessidade do estudo das mudanças que ocorrem no desenvolvimento mental a partir das vivências de cada pessoa. Para ele, “desde os primeiros dias do desenvolvimento da criança, suas atividades adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e, sendo dirigidas a objetivos definidos, são refratadas por meio do prisma do ambiente da criança. O caminho do objeto até a criança e dela até o objeto passa por meio de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social”. (Vygotsky,1984:33)
Segundo essa forma de pensar, constatamos que, apesar de o aprendizado das pessoas ser iniciado muito antes delas frequentarem a escola, o aprendizado escolar introduz elementos novos no seu desenvolvimento. Vygotsky identifica dois níveis de desenvolvimento.
- Um, que se refere às conquistas já efetivadas, àquilo que se sabe o que se é, denominada de Zona de Desenvolvimento Real (ZDR).
- Outro, que se refere àquilo que se pode alcançar, o que se pode aprender e vir a ser, denominada de Zona de Desenvolvimento Potencial (ZDP).
Entre esses dois níveis encontra-se a Zona de Desenvolvimento Proximal, onde acontecem as mediações, que podem levar a criança ou o adulto de uma zona à outra, conforme as mediações, as relações que forem estabelecidas, os conhecimentos que são disponibilizados. O mediador em esportes educativos, ou de Futbeol3, atua nessa Zona. Os professores, de uma forma geral, também atuam nessa zona.
Essa explicação nos ajuda a entender a importância do mediador que atua na zona de desenvolvimento proximal, como faz o mediador nas práticas de Esportes em 3 tempos. Um professor de educação física, ou um mediador, por exemplo, pode propor atividades educativas desde muito cedo. Quanto mais o público dessa atividade, seja ele formado por crianças numa creche ou por adolescentes e jovens em uma escola ou comunidade, tem acesso às diferentes possibilidades, mediadas por alguém que detém conhecimentos importantes para provocar o avanço em seu desenvolvimento, mais esse desenvolvimento ocorre. Por quê ocorre? Porque nessa convivência permanente com outras crianças, adolescentes ou jovens eles vão assimilando, experimentando, refletindo até a aprendizagem que desejam construir ocorrer.
Freire também contribuiu de forma significativa para se entender o papel do mediador. Um ponto importante em que Freire e Vygotsky concordam é o de que o diálogo é um instrumento essencial no desenvolvimento intelectual das pessoas. Por isso, também o diálogo do mediador com os participantes de atividades de Esportes 3 nas Caravanas BOLAção e em outras atividades de esportes em que a mediação está presente tem um papel tão fundamental.
Como o educador e o mediador vão evoluindo em sua aprendizagem para mediarem cada vez mais na zona de desenvolvimento proximal modificando o real e avançando no potencial de cada criança, adolescente e jovem?
Estudando, experimentando, refletindo. Participando de eventos, de oficinas, de redes…
E as crianças, adolescentes e jovens: como aprendem futebol com a mediação que é realizada?
Da mesma forma que a criança vai assimilando a fala e outros conteúdos. Ao ouvir as pessoas falarem ao seu redor, assimila a prática do esporte educativo ou do esporte como ferramenta de desenvolvimento porque tem acesso à orientação desde a creche ou na comunidade, e assim tem a oportunidade de refletir e de vivenciar processos formativos. Quando maior participa de eventos locais, nacionais e internacionais, de intercâmbios, etc.
Todo esse percurso sobre como se dá o processo de aprendizagem contribui para a afirmação de que as pessoas não são seres ocos, mas desde cedo constroem conhecimentos, a partir da formulação de hipóteses. A fim de que seja realmente uma ponte entre o real e o potencial de cada um, aproximando saberes, como propõe Vygotsky, cada educador /mediador deve primeiramente procurar conhecer os públicos com quem trabalha para dessa forma conhecer o que eles sabem e o que precisa ser ampliado no seu conhecimento.
No esporte de alto rendimento ensinamos desde cedo, na escolinha, a técnica, o chute, o lance, a cobertura, a defesa, a tática, mas pouco se associa o aprendizado do esporte com o relacionamento entre os colegas, o trabalho em equipe com a perspectiva do desenvolvimento pessoal, a prática formativa de valores éticos, estéticos, políticos e morais, o combate a preconceitos, a construção de diálogo, a superação de conflitos, a elevação de autoestima e a construção de muitas outras possibilidades. Não é falando que se combatem preconceitos, mas assimilando práticas concretas de não preconceito, vivenciadas em nosso cotidiano.
Por fim, vale ressaltar que a aprendizagem do esporte associada ao desenvolvimento humano e socioeconômico e como ferramenta de transformação social, em práticas seguras e com inclusão de todos é construída em qualquer faixa etária, na medida em que o educador ou o jovem líder/ mediadores atuantes na zona de desenvolvimento proximal, possibilitarem a troca de novos conteúdos que, ao serem assimilados, ampliam cada vez mais a realidade de cada sujeito, público dessa ação. O que cada um assimila depende do tipo de conteúdo apresentado: educativo? Que fortalece a competição? Que garante a inclusão? Restritivo?
Nas atividades de FutRua3, por exemplo, durante a mediação (1º e 3º tempos) e durante o jogo (2º tempo) mediadores e jogadores constroem juntos conhecimentos sempre com possibilidades de novas sínteses serem expressas, refletindo a diversidade de pontos de vista sobre o mundo em que cada um está mais centrado.
[1] Este texto contém fragmentos de diversas reflexões feitas por Regina Cabral nos últimos quinze anos e, também, é parte da fundamentação teórica do Projeto BOLAção, conebido pela Incubadora de Esportes e Cidadania, do Formação, sob a coordenação de Diane Pereira Sousa. Parte do texto está na sistematização do Projeto BOLAção, que o Formação produziu para publicação de SFW – Sony.
[2] Piaget subdivide o desenvolvimento intelectual em quatro estágios: sensório-motor (dos 0 aos 18/24 meses); pré-operatório (dos 2 aos 7 anos); operações concretas (dos 7 aos 11/12 anos); operações formais (dos 11/12 anos aos 15/16 anos).
Freud define cinco estágios do desenvolvimento psicossexual: oral (0 – 12/18 meses); anal (12/18 meses – 2/3 anos); fálico (2/3 anos – 5/6 anos); latência (5/6 anos – puberdade); genital (depois da puberdade).
Erikson propõe oito estágios de desenvolvimento considerando aspectos biológicos, individuais e sociais. Cada estágio atravessado por uma crise psicossocial: 1ª idade – Confiança versus Desconfiança (0 – 18 meses); 2ª idade – Autonomia versus Dúvida e Vergonha (18 meses – 3 anos); 3ª idade – Iniciativa versus Culpa (3 – 6 anos); 4ª idade – Indústria/Mestria versus Inferioridade (6 – 12 anos); 5ª idade – Identidade versus Difusão/Confusão (12 – 18/20 anos); 6ª idade – Intimidade versus Isolamento (18/20 – 30 e tal anos); 7ª idade – Generatividade versus Estagnação (30 e tal – 60 e tal anos); 8ª idade – Integridade versus Desespero (depois dos 65 anos).